sexta-feira, 30 de março de 2018

Stendhal - O Vermelho e o Negro: Uma Negociação (V)

Stendhal - O Vermelho e o Negro



Livro I

A verdade, a áspera verdade. 
Danton 


Capítulo V

UMA NEGOCIAÇÃO


Cunctando restituit rem.
ENNIUS






RESPONDE-ME SEM MENTIR, se és capaz, cão maldito; de onde conheces a sra. de Rênal, quando falaste com ela?

– Jamais lhe falei, respondeu Julien, jamais vi essa senhora a não ser na igreja.

– Mas olhaste para ela, seu descarado?

– Nunca! O senhor sabe que na igreja só vejo a Deus, respondeu Julien com um arzinho hipócrita, muito próprio, segundo ele, para evitar mais um tapa na cabeça.

– Há no entanto alguma coisa aí, replicou o aldeão astuto, e calou-se por um instante. Mas por teu intermédio nada saberei, maldito hipócrita. O fato é que vou me livrar de ti e minha serraria vai melhorar com isso. Conquistaste o sr. cura ou algum outro, que te conseguiu um belo cargo. Vai arrumar teus pertences, te levarei à casa do sr. de Rênal onde serás preceptor das crianças.

– Que ganharei com isso?

– Comida, roupa e 300 francos de salário.

– Não quero ser criado.

– Animal, quem te falou de ser criado? acha que eu consentiria em meu filho ser criado?

– Mas com quem comerei?

Essa pergunta desconcertou o velho Sorel, ele sentiu que, se falasse, poderia cometer alguma imprudência; enfurecido, cobriu Julien de injúrias, acusando-o de gula, e deixou-o para ir consultar os outros filhos.

Julien os viu pouco depois, reunidos em conselho, cada um apoiado sobre seu machado. Após observá-los por algum tempo e vendo que nada podia adivinhar, Julien foi para o outro lado da serraria, para evitar ser surpreendido. Ele queria pensar nesse anúncio imprevisto que mu​dava seu destino, mas sentiu-se incapaz de prudência; sua imaginação ocupava-se inteiramente com o que veria na bela casa do sr. de Rênal.

Melhor renunciar a tudo isso, pensou, do que ser obrigado a comer com os criados. Meu pai quererá forçar-me a tanto; prefiro morrer. Tenho quinze francos e oito vinténs de economias, fugirei esta noite; em dois dias, por atalhos onde não há perigo de encontrar gendarmes, estou em Besançon; lá, alisto-me como soldado e, se preciso, passo para a Suíça. Mas, nesse caso, adeus minhas ambições, adeus essa bela carreira de padre que leva a tudo.

Esse horror de comer com os criados não era natural a Julien, para chegar à fortuna ele teria feito coisas bem mais penosas. Essa repugnância vinha das Confissões, de Rousseau. Era o único livro com o auxílio do qual sua imaginação concebia o mundo. A coletânea dos boletins do grande exército e o Memorial de Santa Helena completavam seu Alcorão. Ele enfrentaria a morte por essas três obras. Jamais acreditou em nenhuma outra. Segundo uma frase do velho cirurgião-mor, ele considerava todos os outros livros do mundo como mentirosos e escritos por velhacos para ganhar dinheiro.

Juntamente com uma alma de fogo, Julien tinha uma daqueles memórias espantosas frequentemente associadas à tolice. Para conquistar o velho cura Chélan, do qual via bem que dependia sua sorte futura, aprendera de cor todo o Novo Testamento em latim, conhecia também o livro Do papa, do sr. de Maistre, e acreditava tão pouco num quanto noutro.

Como por um acordo mútuo, Sorel e o filho evitaram falar-se naquele dia. Ao anoitecer, Julien foi tomar sua lição de teologia na casa do cura, mas julgou prudente nada lhe dizer da estranha proposta que haviam feito a seu pai. Talvez seja uma armadilha, pensava, convém fingir tê-la esquecido.

No dia seguinte de manhã cedo, o sr. de Rênal mandou chamar o velho Sorel que, após ter-se feito esperar uma hora ou duas, acabou por chegar, oferecendo desde a entrada cem escusas, entremeadas de outras tantas reverências. À força de percorrer todo tipo de objeções, Sorel compreendeu que seu filho comeria com o dono e a dona da casa, e, nos dias em que houvesse convidados, sozinho numa peça à parte com as crianças. Sempre mais disposto a levantar questões à medida que percebia uma verdadeira pressa no sr. prefeito, e aliás cheio de desconfiança e de espanto, Sorel pediu para ver o quarto onde dormiria o filho. Era uma grande peça muito bem mobilia​da, mas para a qual estavam sendo transportadas as camas das três crianças. 

Essa circunstância foi um raio de luz para o velho aldeão; ele pediu em seguida, com segurança, para ver a roupa que dariam ao filho. O sr. de Rênal abriu a escrivaninha e tirou cem francos.

– Com esse dinheiro, seu filho irá ao sr. Durand, o vendedor de tecidos, e terá um traje preto completo.

– E se eu o retirar de sua casa, disse o aldeão, que de repente esquecera suas formas de deferência, esse traje preto permanecerá com ele?

– Sem dúvida.

– Bem, disse Sorel, num tom de voz arrastado, só nos resta então entrar em acordo quanto a uma única coisa: o dinheiro que o senhor lhe dará.

– Como! exclamou o sr. de Rênal indignado, estamos de acordo desde ontem: ofereço 300 francos; é o bastante, creio, e talvez demais.

– Foi a sua oferta, não nego, disse o velho Sorel, falando ainda mais lentamente; e, por um esforço de gênio que não surpreenderá os que conhecem os camponeses do Franco-Condado, acrescentou, olhando fixamente o sr. de Rênal: Temos uma melhor noutra parte.

A essas palavras a fisionomia do prefeito agitou-se. Ele conteve-se, porém, e, depois de uma hábil conversa de duas horas, em que nenhuma palavra foi dita ao acaso, a astúcia do camponês prevaleceu sobre a astúcia do homem rico, que dela não tem necessidade para viver. Todos os inúmeros artigos que deviam regulamentar a nova existência de Julien foram acertados; não apenas seu ordenado foi estabelecido em 400 francos, mas também que seria pago antecipadamente, no primeiro dia de cada mês.

– Muito bem! dar-lhe-ei 35 francos, disse o sr. de Rênal.

– Para arredondar, um homem rico e generoso como o senhor prefeito, disse o aldeão com uma voz meiga, concordará com 36 francos.

– Seja, disse o sr. de Rênal, mas acabemos com isso.

No momento, a cólera dava-lhe o tom da firmeza. O aldeão viu que devia deter seu avanço. Foi a vez, então, de o sr. de Rênal contra-atacar. Ele jamais pretendera entregar a primeira mesada de 36 francos ao velho Sorel, muito apressado em recebê-la pelo filho. O sr. de Rênal chegou a pensar que seria obrigado a contar à mulher o papel que desempenhara em toda essa negociação.

– Devolva-me os cem francos que lhe dei, disse ele, com humor. O sr. Durand deve-me alguma coisa. Irei com seu filho arrecadar o tecido preto.

Depois desse gesto de firmeza, Sorel voltou prudentemente às suas fórmulas respeitosas; elas ocuparam um bom quarto de hora. Ao final, vendo que não havia decididamente mais nada a ganhar, retirou-se. Sua última reverência terminou com estas palavras:

– Enviarei meu filho ao castelo.

Era assim que os administrados do sr. prefeito chamavam sua casa quando queriam agradá-lo.

De volta à sua oficina, em vão Sorel procurou pelo filho. Desconfiado do que pudesse acontecer, Julien saíra no meio da noite. Quisera colocar em segurança seus livros e sua cruz da Legião de Honra. Havia transportado tudo para a casa de um jovem comerciante de madeira, seu amigo, chamado Fouqué, que morava na alta montanha que domina Verrières.

Quando reapareceu, o pai disse-lhe: – Sabe Deus, maldito preguiçoso, se alguma vez terás suficiente honra para pagar-me o preço de tua comida, que adianto há tantos anos! Pega teus trapos e vai para a casa do sr. prefeito.

Julien, surpreso de não ser surrado, apressou-se em partir. Mas, tão logo desapareceu da vista de seu terrível pai, diminuiu o passo. Julgou que seria útil à sua hipocrisia passar pela igreja.

A palavra vos surpreende? Antes de chegar a essa horrível palavra, a alma do jovem aldeão percorrera um longo caminho.

Desde que vira, na primeira infância, alguns dragões do 6o regimento, com longas túnicas brancas e capacetes de crinas negras, regressarem da Itália e atrelarem os cavalos à janela gradeada da casa do pai, Julien apaixonara-se pela vida militar. Mais tarde escutava, enlevado, os relatos das batalhas da ponte de Lodi, de Arcole, de Rivoli que o velho cirurgião-mor lhe fazia. Observava os olhares inflamados que o ancião lançava à sua cruz.

Mas, quando Julien tinha catorze anos, começaram a construir em Verrières uma igreja que pode ser chamada de magnífica para uma cidade tão pequena. Suas quatro colunas de mármore, sobretudo, impressionaram Julien; elas se tornaram célebres na região pelo ódio que suscitaram entre o juiz de paz e o jovem vigário, enviado de Besançon, que era tido por espião da Congregação. O juiz de paz esteve a ponto de perder seu cargo, pelo menos era a opinião comum. Não ousara ele disputar com um padre que, a cada quinze dias, ia a Besançon, onde se avistava, diziam, com o bispo?

Nesse meio tempo, o juiz de paz, pai de uma numerosa família, emitiu várias sentenças que pareceram injustas; todas foram proferidas contra os habitantes que liam o Constitutionnel. O bom partido triunfou. Não se tratava, é verdade, senão de quantias de três ou de cinco francos; mas uma dessas pequenas multas teve de ser paga por um frabricante de pregos, padrinho de Julien. Em sua cólera, esse homem exclamava: “Que mudança! E dizer que, há mais de vinte anos, o juiz de paz era considerado um homem de bem!” O cirurgião-mor, amigo de Julien, já havia morrido.

De repente Julien parou de falar de Napoleão; anunciou o projeto de tornar-se padre, e era visto constantemente, na serraria do pai, ocupado em aprender de cor uma bíblia latina que o cura lhe emprestara. Esse bom velho, maravilhado com seus progressos, passava noites inteiras a ensinar-lhe a teologia. Julien demonstrava dian​te dele apenas sentimentos piedosos. Quem poderia adivinhar que aquele jovem com rosto de moça, tão pálido e doce, ocultava a resolução inabalável de preferir expor-se à morte do que não fazer fortuna!

Para Julien, fazer fortuna era antes de mais nada sair de Verrières; ele abominava sua pátria. Tudo o que via ali gelava-lhe a imaginação.

Desde sua primeira infância ele tivera momentos de exaltação. Imaginava então, com delícia, que um dia seria apresentado às belas mulheres de Paris, saberia chamar a atenção delas por algum feito notável. Por que não seria amado por uma delas, como Bonaparte, ainda pobre, fora amado pela brilhante Madame de Beauharnais? Havia muitos anos, Julien não passava talvez uma hora de seu dia sem dizer-se que Bonaparte, tenente obscuro e sem fortuna, fizera-se o senhor do mundo com sua espada. Essa ideia o consolava de seus infortúnios que ele acreditava grandes, e redobrava sua alegria, quando a tinha.

A construção da igreja e as sentenças do juiz de paz de repente o iluminaram; uma ideia o deixou como enlouquecido durante algumas semanas, e enfim apoderou-se dele com a onipotência da primeira ideia que uma alma apaixonada acredita ter inventado.

“Quando Bonaparte fez que falassem dele, a França tinha medo de ser invadida; o mérito militar era necessário e estava em moda. Hoje, vemos padres de quarenta anos com rendimentos anuais de cem mil francos, isto é, três vezes mais que os famosos generais da divisão de Napoleão. Eles precisam de pessoas que os apoiem. Vejam esse juiz de paz, tão sensato, tão honesto até então, tão velho, que se desonra por temor de desagradar um jovem vigário de trinta anos. Preciso ser padre.”

Certa vez, em meio à sua nova piedade, fazendo já dois anos que Julien estudava teologia, ele foi traído por uma irrupção súbita do fogo que devorava sua alma. Foi na casa do sr. Chélan, num jantar de padres durante o qual o bom cura o apresentara como um prodígio de instrução: sucedeu-lhe de enaltecer Napoleão com furor. Ele atou o braço direito contra o peito, alegou tê-lo deslocado ao remover um tronco de pinheiro, e o manteve durante dois meses nessa incômoda posição. Depois desse castigo aflitivo, perdoou-se. Eis o jovem de dezenove anos, mas de aparência frágil e a quem dariam no máximo de​zessete, que agora entrava com um pequeno pacote sob o braço na magnífica igreja de Verrières.

Encontrou-a escura e solitária. Por ocasião de uma festa, todas as janelas do prédio haviam sido cobertas de pano carmesim. Disso resultava, aos raios do sol, um efeito de luz deslumbrante, de caráter mais imponente e mais religioso. Julien estremeceu. Sozinho na igreja, instalou-se no banco que tinha a mais bela aparência, e que trazia as armas do sr. de Rênal.

Sobre o genuflexório, Julien observou um pedaço de papel impresso, posto ali como para ser lido. Viu escrito:

Detalhes da execução e últimos momentos de Louis Jenrel, executado em Besançon, no...

O papel estava rasgado. No verso liam-se as duas primeiras palavras de uma linha: O primeiro passo.

– Quem teria deixado esse papel aí?, disse Julien. Pobre infeliz, acrescentou com um suspiro, seu nome termina como o meu... E amarrotou o papel.

Ao sair, Julien acreditou ver sangue junto à pia; era água benta derramada: o reflexo das cortinas vermelhas que cobriam as janelas a fazia parecer sangue.

Por fim, Julien envergonhou-se de seu terror secreto.

Serei um covarde?, pensou. Às armas!

Essa expressão frequentemente repetida nos relatos de batalha do velho cirurgião era heroica para Julien. Ele levantou-se e caminhou rapidamente até a casa do sr. de Rênal.

Apesar dessa resolução corajosa, assim que a avistou a vinte passos foi tomado de uma invencível timidez. A grade de ferro estava aberta, a casa parecia-lhe magnífica, era preciso entrar lá dentro.

Julien não foi a única pessoa cujo coração agitou-se por sua chegada a essa casa. A extrema timidez da sra. de Rênal perturbava-se pela ideia desse estranho que, em virtude de suas funções, ia constantemente estar entre ela e os filhos. Estava acostumada a ter os filhos dormindo em seu quarto. De manhã, muitas lágrimas rolaram quando viu transportarem suas camas para os aposentos destinados ao preceptor. Em vão pediu ao marido que a cama de Stanislas-Xavier, o mais jovem, voltasse a seu quarto.

A delicadeza da mulher desenvolvera-se a um ponto extremo na sra. de Rênal. Ela fazia a imagem mais desagradável do preceptor, um indivíduo grosseiro e mal penteado, encarregado de repreender os filhos unicamente porque sabia latim, uma língua bárbara em razão da qual as crianças seriam castigadas.




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ADVERTÊNCIA DO EDITOR
Esta obra estava prestes a ser publicada quando os grandes acontecimentos de julho [de 1830] vieram dar a todos os espíritos uma direção pouco favorável aos jogos da imaginação. Temos motivos para acreditar que as páginas seguintes foram escritas em 1827.


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Henri-Marie Beyle, mais conhecido como Stendhal (Grenoble, 23 de janeiro de 1783 — Paris, 23 de março de 1842) foi um escritor francês reputado pela fineza na análise dos sentimentos de seus personagens e por seu estilo deliberadamente seco.

Órfão de mãe desde 1789, criou-se entre seu pai e sua tia. Rejeitou as virtudes monárquicas e religiosas que lhe inculcaram e expressou cedo a vontade de fugir de sua cidade natal. Abertamente republicano, acolheu com entusiasmo a execução do rei e celebrou inclusive a breve detenção de seu pai. A partir de 1796 foi aluno da Escola central de Grenoble e em 1799 conseguiu o primeiro prêmio de matemática. Viajou a Paris para ingressar na Escola Politécnica, mas adoeceu e não pôde se apresentar à prova de acesso. Graças a Pierre Daru, um parente longínquo que se converteria em seu protetor, começou a trabalhar no ministério de Guerra.

Enviado pelo exército como ajudante do general Michaud, em 1800 descobriu a Itália, país que tomou como sua pátria de escolha. Desenganado da vida militar, abandonou o exército em 1801. Entre os salões e teatros parisienses, sempre apaixonado de uma mulher diferente, começou (sem sucesso) a cultivar ambições literárias. Em precária situação econômica, Daru lhe conseguiu um novo posto como intendente militar em Brunswick, destino em que permaneceu entre 1806 e 1808. Admirador incondicional de Napoleão, exerceu diversos cargos oficiais e participou nas campanhas imperiais. Em 1814, após queda do corso, se exilou na Itália, fixou sua residência em Milão e efetuou várias viagens pela península italiana. Publicou seus primeiros livros de crítica de arte sob o pseudônimo de L. A. C. Bombet, e em 1817 apareceu Roma, Nápoles e Florença, um ensaio mais original, onde mistura a crítica com recordações pessoais, no que utilizou por primeira vez o pseudônimo de Stendhal. O governo austríaco lhe acusou de apoiar o movimento independentista italiano, pelo que abandonou Milão em 1821, passou por Londres e se instalou de novo em Paris, quando terminou a perseguição aos aliados de Napoleão.

"Dandy" afamado, frequentava os salões de maneira assídua, enquanto sobrevivia com os rendimentos obtidos com as suas colaborações em algumas revistas literárias inglesas. Em 1822 publicou Sobre o amor, ensaio baseado em boa parte nas suas próprias experiências e no qual exprimia ideias bastante avançadas; destaca a sua teoria da cristalização, processo pelo que o espírito, adaptando a realidade aos seus desejos, cobre de perfeições o objeto do desejo.

Estabeleceu o seu renome de escritor graças à Vida de Rossini e às duas partes de seu Racine e Shakespeare, autêntico manifesto do romantismo. Depois de uma relação sentimental com a atriz Clémentine Curial, que durou até 1826, empreendeu novas viagens ao Reino Unido e Itália e redigiu a sua primeira novela, Armance. Em 1828, sem dinheiro nem sucesso literário, solicitou um posto na Biblioteca Real, que não lhe foi concedido; afundado numa péssima situação económica, a morte do conde de Daru, no ano seguinte, afetou-o particularmente. Superou este período difícil graças aos cargos de cônsul que obteve primeiro em Trieste e mais tarde em Civitavecchia, enquanto se entregava sem reservas à literatura.

Em 1830 aparece sua primeira obra-prima: O Vermelho e o Negro, uma crónica analítica da sociedade francesa na época da Restauração, na qual Stendhal representou as ambições da sua época e as contradições da emergente sociedade de classes, destacando sobretudo a análise psicológica das personagens e o estilo direto e objetivo da narração. Em 1839 publicou A Cartuxa de Parma, muito mais novelesca do que a sua obra anterior, que escreveu em apenas dois meses e que por sua espontaneidade constitui uma confissão poética extraordinariamente sincera, ainda que só tivesse recebido o elogio de Honoré de Balzac.

Ambas são novelas de aprendizagem e partilham rasgos românticos e realistas; nelas aparece um novo tipo de herói, tipicamente moderno, caracterizado pelo seu isolamento da sociedade e o seu confronto com as suas convenções e ideais, no que muito possivelmente se reflete em parte a personalidade do próprio Stendhal.

Outra importante obra de Stendhal é Napoleão, na qual o escritor narra momentos importantes da vida do grande general Bonaparte. Como o próprio Stendhal descreve no início deste livro, havia na época (1837) uma carência de registos referentes ao período da carreira militar de Napoleão, sobretudo a sua atuação nas várias batalhas na Itália. Dessa forma, e também porque Stendhal era um admirador incondicional do corso, a obra prioriza a emergência de Bonaparte no cenário militar, entre os anos de 1796 e 1797 nas batalhas italianas. Declarou, certa vez, que não considerava morrer na rua algo indigno e, curiosamente, faleceu de um ataque de apoplexia, na rua, sem concluir a sua última obra, Lamiel, que foi publicada muito depois da sua morte.



O reconhecimento da obra de Stendhal, como ele mesmo previu, só se iniciou cerca de cinquenta anos após sua morte, ocorrida em 1842, na cidade de Paris.

Stendhal - O Vermelho e o Negro: Uma Negociação (V)
Stendhal - O Vermelho e o Negro: O Constrangimento (VI)


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