terça-feira, 8 de setembro de 2015

XXIV – Mitologia dos Orixás: Olocum [238] [239]

Olocum


Reginaldo Prandi




Olocum acolhe todos os rios e torna-se a rainha das águas


Olocum, a senhora do mar,

e Olossá, a senhora da lagoa,

andavam ambas muito preocupadas.

As águas já não eram suficientes para suprir

as necessidades do povo, que já padecia

da sede provocada pela longa seca.

Olocum e Olossá foram aos pés de Orunmilá,

que as aconselhou a fazer oferendas

para que a abundância das águas retornasse.

Era um sacrifício grande para ambas,

mas Olocum cumpriu o recomendado.

Olossá, porém, ofereceu seus sacrifícios incompletos.



E veio a chuva e choveu tanto que as águas já não cabiam

no curso dos rios.

Oxum, o rio, foi consultar Ifá

para saber que destino dar ao curso de suas águas.

Oxum foi orientada por Ifá

para procurar onde fosse bem recebida.

Assim, Oxum reuniu as águas do rio

e seguiu caminho.

Encontrou a lagoa, encontrou ossá,

e nela se precipitou,

mas as águas da lagoa transbordaram.

Deixou a lagoa e chegou ao mar, o ocum,

e ali derramou todas as suas águas

e o mar recebeu o rio Oxum sem transbordar.



Então todos os rios fizeram a mesma rota

e encaminharam suas águas para o mar, o ocum.

E Olossá teve que se conformar com o segundo posto.

Olocum fez corretamente o sacrifício.

Olocum é a rainha de todas as águas.

[238]






Olocum mostra sua força destruidora



O mundo foi criado por Olorum e sua mulher Olocum.

Eles tinham a mesma idade.

Da união de Olocum com Aiê, a Terra, nasceu Iemanjá.

Da união de Iemanjá e Aganju nasceram os outros deuses.

Mas Olorum separou-se de Olocum

e por longo tempo ambos brigaram

pelo poder de reinar na Terra.

Certa vez Olocum quis demosntrar seu poder.

Olocum invadiu a terra com suas águas

e destruiu parte da humanidade com essa catástrofe.

Só não foi pior porque Olorum, de onde estava,

estendeu uma corrente que descia à terra

e os homens subiram às montanhas,

salvando-se assim a espécie humana.

Os sobreviventes consultaram Ifá

e fizeram oferendas para apaziguar Olocum.

Com a corrente usada para salvar os homens,

Olorum ataou Olocum ao fundo do mar.

Lá está ela até hoje,

acompanhada de uma gigantesca serpente marinha,

que, na lua nova, segundo contam,

mostra sua cabeça fora d’água.



Olocum propôs um pacto a Olorum:

Olocum não teria mais poder na terra,

mas a cada dia faria os homens sentirem sua força,

que brota das profundezas do oceano.

O ser humano tinha que saber, tinha que sentir

que seu poder era de vida e morte.

Era o que queria Olocum e Olorum concordou.

Assim, a cada dia, quando alguém se afoga no mar,

Olocum recebe uma vida humana em sacrifício.

Todos temem o poder de Olocum.

Todos os dias, alguém se afoga no mar.

[239]



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Leia também:

XXIII – Mitologia dos Orixás: Iemanjá [220] [221]

XXV – Mitologia dos Orixás: Onilé [242]

Reginaldo Prandi, paulista de Potirendaba e professor titular de sociologia da Universidade de São Paulo, é autor de três dezenas de livros. Pela editora Hucitec publicou Os candomblés de São Paulo, pela Edusp, Um sopro do Espírito, e pela Cosac Naify, Os príncipes do destino. Dele, a Companhia das Letras publicou também Segredos guardados: orixás na alma brasileira; Morte nos búzios; Ifá, o Adivinho; Xangô, o Trovão; Oxumarê, o Arco-Íris; Contos e lendas afro-brasileiros: a criação do mundo; Minha querida assombração; Jogo de escolhas e Feliz Aniversário.



Prandi, Reginaldo. Mitologia dos Orixás / Reginaldo Prandi; ilustrações de Pedro Rafael. - São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

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