terça-feira, 28 de janeiro de 2014

O barbeiro-sangradô e os fidalgo parasita

Ensaio 31B
baitasar
A escravidão dos preto na Vila podia tê alguma diferença da escravatura nas fazenda das plantação, nas charqueada, mais não mudava qui os preto tinha dono. Não podia tê vontade própria, precisava obedecê té no jeito de criá os fio. Nem a decifração das letra escrita os preto podia sabê. Os dono da escravidão não deixava os preto sabê lê. A obrigação dos preto era com os trabalho nas plantação, nas charqueada. Tinha vez que era preciso tê briga com a castelhanada, então os dono da escravidão fazia a arregimentação militá dos escravo: prometia o qui não cumpria. A libertação. As preta tinha as tarefa diferente, mais não escapava de sê propriedade do siô branco.
Os dono da escravidão qui tinha fio fazia gosto de usá os serviço da muié preta no descabaço de guri. Os primeiro favô do piá pra encabeçá muié era na escrava da escolha do siô patrão
—        Até podia ser com algum outro animal, como foi no nosso tempo de guri solto com as bezerras do campo, lembra conde?
—        Coronel, não vamos dificultar com lembranças de tão longe. Usar o que lhe pertence, no seu gosto, é um dos direitos sagrados da propriedade, não aceite lições de quem quer que seja.
Quando o guri tava perto do tempo de conhecê muié, o siô dono de tudo escolhia a preta qui mais lhe apetecia. Tinha qui tá intocada. Primeiro o siô perguntava
—        A neguinha já conheceu homem? — se respondia qui já tinha sido enfiada, apanhava por não tê esperado as ordem do siô patrão, mais depois voltava pra sua lida; caso tivesse coragem de mentí — Não conheço homê — coisa fácil de descobrí. Apanhava e não voltava. O siô dono de tudo vendia a enganosa fingida. Era o tempo da lição da chibata e do exemplo
—        Preciso manter o controle das rédeas sempre esticadas.
Depois de procurá e se certificá de sê o primeiro, fazia a escolha melhó pra lhe serví os modo. Dava as instrução à menina, pessoalmente, três a quatro na semana. Quando achava qui a escrava tava no seu gosto, soltava o guri. As preta escrava com serventia na cama nunca sabia se ia parí o fio ou o neto do siô dono de tudo.
Pra compensá tanta tarefa, os dono de tudo consentia na aparição dos preto nas missa domingueira, antes da domingueira dos branco. Tudo pra não misturá o deus dos preto com o deus dos branco. Não durô muito o jeito de fazê duas missa, nem se sabe com certeza certa quem causô de mudá as duas missa em uma só. Uns achô qui foi o siô padre causo de quê não queria trabalhá duas missa domingueira; otros jurava qui foi arrumação direta do Siô Grande Siô, cansado dessa besteira de missa branca, missa preta. O desconforto dos branco nas domingueira era qui as palavra da reprimenda do siô padre pros ouvido dos branco entrava nos ouvido dos preto, ficava parecendo qui os pecado dos branco era igual os pecado dos preto.
Os branco não ficô conformado, é claro, té qui o siô padre achô otra solução mais pacífica: divinizô o departamento dos branco, na frente; e o departamento dos preto, atrás. Trocando em miúdo, os branco sentava mais perto do palanque do oratório, os preto sentava mais perto da porta da saída, mais não saía primeiro. Depois do sinal qui o sô padre repetia no fim da missa, o Siô Pai, Siô Fio e do Espírito Santo, amém, ele aconselhava
—        Ide em paz! E que o Sinhô os acompanhe! — os preto qui tava sentado levantava, mais continuava em pé parado, esperando os branco saí pela porta da frente. Quando não tinha mais branco na igreja, os preto podia saí pelas porta do lado. O parasitismo branco não ia se deixá desmoroná pelas missa e as palavra do siô padre, nem acabá o jeito de dominá por quem tinha feito as leis pra tê o direito de mandá.
O parasitismo religioso nunca pareceu parasita, pelo menos, pra aquele qui acredita qui o céu dos branco é diferente do céu dos preto, qui os preto precisava sofrê a escravidão e mostrá pra deus qui também merecia o céu dos branco. O siô padre tava lá, na tribuna do sermão, rezando pelo sonho do céu; a esperança de uma otra vida, otra chance. Impedindo pelo medo do inferno: a rebelião, a teimosia, o motim, a desobediência, a resistência, a rebeldia. E perdoando o navio negreiro, a chibata, o enforcamento, o defloro das pretas, o capitão-do-mato.
O céu coberto de preto qui tinha existido nas terra da África acabô com a chegada dos branco. Depois qui o primeiro escravizadô desembarcô nas terra do céu preto, e perguntô
—        Por que trabalhar se os negros podem fazer o trabalho das terras, das cidades... pela comida, roupa e estadia? — o trabalho dos preto escravizado passô a valê tanto quanto as prata e os ouro das mina. Ninguém achava estranho, só os preto escravizado.
Eram contados por cabeça, como as cabeça do gado. Virô vício comprá e tê escravo. Os dono da escravidão mandava os fio estudá longe, pra aprendê o jeito certo de escrevê e lê. Os piá ia de navio diferente dos navio negreiro. Os preto qui vinha de contrabando nos navio negreiro pagava com sangue, suô e saudade, os estudo dos fio dos dono da escravidão. Os preto era mantido miserável e inculto pra não tê otra vida. Não tê sonho.
Branco sensato ou insensato acreditava qui a natureza fazia dos preto escravo; não era os navio negreiro, as corrente, as chibata, a fome, a saudade, as doença, os padre, as lei, os capitão-do-mato, os enforcamento, as canga, as pulícia, as prisão. Os fidalgo lusitano treinarô os qui quiserô aprendê, como utilizá e se empanturrá do trabalho escravo pra tê sua vida apática, desleixada e preguiçosa. Queriam qui fosse luxuosa pra sempre
—        Entendeu por que ocê tá sentado no banco do cobradô, no lugá de tá sentado no banco da escola? O fioneto entendeu?
—        Avó, eu não posso lhe colocá atenção!
Bobagem, é só escutá com o coração a razão das coisa sê como são. Os fidalgo lusitano abrirô a estrada das água pro tráfico dos preto e renunciarô aos hábito do trabalho. E assim, nasceu essa fidalguia ignorante, egoísta, devassa, preguiçosa e beata. Perdida dos hábito do trabalho, mais com o espírito sossegado pela pompa de algum frade gordo e conversado. O moleque qui aceita tudo, perdoa tudo por dinheiro
—        Tá escutando, mi fioneto? Ocê precisa sabê quem é e donde veio, presta atenção qui vô repetí bem degavarzinho: somos os que se foram, estamos nos que virão.
—        Tô escutando, Avó. Feeeecha! Um passinho mais à frente, por favor! Não queremos deixar os tio e as tia esperando pelo próximo... Avó, por favor, não é hora!
—        Nunca vai sê hora se esperá pela melhó hora. Se ocê não sabe por que tá sentado aqui e não tá sentado no banco da escola, não vai saí daqui. E se saí não vai sabê porque saiu, e se não sabe vai aceitá as tagarelice branca qui não se esforçô e não lutô como os branco. Tudo tontice.
—        Avó, tô aqui porque não quis continuar lá.
—        Não foi bem assim, a sua véia lembra qui quando ocê começô na escola ocê só queria sabê da escola, depois o qui aconteceu ocê deve sabê melhó do qui essa velha.
—        A avó tá muito esperta.
—        Precisei morrê pra sabê da vida, queria qui ocê não precise aprendê do jeito dessa velha.
Olha pra rua, escutá o soluçá dos escravo.
Na rua dos vendedô, carregadô e barbeiro, os preto trabalhava por conta nos ganho, mais tinha a obrigação de entregá aos dono branco as moeda combinada. A entregação do didndin não podia passá do fim do dia. Os qui contava com a sorte juntava um pouco daqui, outro dali, pra fazê um pecúlio; pra modo de pagá pro siô do seu trabalho a indenização do seu valô, e ganhá a alforria. Ali, naquelas margem desabitada de branco, luz e calçamento, tinha muié preta metida no comércio da rua. Eram mais pouca qui os preto, mais era delas a variação do quefazê. A cantoria ficava por conta das muié.
Depois qui saiu da visitação na sacristia, o aconselhadô do governadô, qui não gostava de andá, mais andava pelo pedido do patrão, saiu em meio as gente da rua, escutando, falando, vendo, e se paro. Coisa qui também não fazia, ficá parado na rua, inda mais naquelas margem. Parô a caminhada pra vê um barbeiro-sangradô trabalhando. O escravo atendia otro preto qui tava sentado numa pedra da rua
—        Como a Avó sabe que o barbeiro-sangrador era escravo?
—        O mi fioneto parece qui só tem na cabeça o jeito de pensá o dinheiro qui recebe e o troco qui dá. E lá, naquele tempo de acorrentá e batê nos preto, inté fazê a carne avivá, os preto tinha otro jeito de vivê, ou melhó, otro jeito de esperá inté morrê?
—        E os negros alforriados?
A Avó resolveu ficar pendurada no agarrador do teto, balançando, indo e voltando
—        O mi fioneto tá com as ideia atrapalhada, acredita qui os preto teve vida mansa depois de desacorrentado...
—        Pois fique a Avó sabendo que essas ideias aprendi na escola.
A Avó ficou no seu silêncio pensativo, não parecia triste, mas não tava certa do que dizer. Parou de balançar e sentou no chão do ônibus, misturada com os pés e as pernas dos passageiros. Não tenho certeza, mas acho que ela tava cantando quando me olhou; tinha encontrado as palavras que queria me dizer
—        Nunca disse qui as coisa dita na escola são tudo verdade. As história são contada pelos qui tem a força, o mando e a consideração da maioria, mais nem sempre a maioria tá certa, tem vez qui a maioria é enganada pelas vontade da minoria, pela astúcia e talento da mentira qui a minoria sabe contá. É bem assim, as história são contada pelo vencedô, inté os branco perdedô reclama do jeito qui as história tá contada.
—        A Avó fala dum jeito sobre as histórias contadas que até dá vontade de ser professor da história.
—        Não é sem tempo, mais a história dos preto, té agora, foi contada pelos branco, pois tá na hora dessa história sê contada e cantada pelos preto... ocê tem qui contá.
—        Não sei contar histórias como a Avó.
—        Bobagem mi fioneto, quem disse qui contá as coisa qui aconteceu precisa esperteza e talento?
A Avó tava sentada no assoalho batendo tambor. E mesmo as pessoas que não queriam estavam dançando. Primeiro, como se com a batucada fosse obrigação remexer o corpo, manobrar a cintura. A negrada girando pela liberdade, as coxas, os braços, a cabeça, o suor espumante, o sorriso branco e fértil, os lábios grossos, os seios, o ventre, o nariz achatado, a carapinha, tudo cantava com a batucada; depois, dançavam como se fosse alegria, até que passou a ser uma necessidade com os pés, as mãos, a congada da coroação do nosso Rei
—        Precisa o quê?
—        Sabê escutá as palavra qui tá escrita e descobrí aquelas qui não tá escrita; precisa querê ouví as história qui é contada de pai pra fio, mãe pra fia, desde os tempo qui os preto vivia na terra-mãe. E depois, não tê medo de saí por aí contando as história.
Olha pra rua, já tá conseguindo escutá?
O aconselhadô parô pra vê o tal barbeiro-sangradô. O preto além de cortá cabelo e raspá barba sabia tirá o sangue doente dos preto. Gostava de fazê uso das sanguessuga. O escravo adoentado sentava na calçada e se entregava nas habilidade do barbeiro com as bicha parasita.
Mais adiante tinha o tambô e as cantoria ao ar livre. A rua da Floresta era a rua dos batuque com os pé no chão, sem o assoalho das tábua. Os preto só precisava tê cuidado com as pulícia. Já vem daquele tempo, qui nas pulícia tinha os preto qui era preto e avisava das batida nas festa dos batuque; mais também, tinha os preto virado pulícia qui queria esquecê a cô qui tinha e não avisava das batida. Fingia qui sabia vivê com os branco, mais faltava sê dono de preto escravo. Isso não conseguia.
Seguido chegava as denúncia contra os batuque dos tambô, quase sempre nos domingo. As pulícia saía da toca pra cumprí as lei imperial: serená os divertimento dos preto forro. Causava estranheza a batucada e as dança dos preto. Os branco nunca entendeu qui aquele bailado não era briga nem desordem, mais o jeito dos preto encontrá o olhá dos antigo. O passado acontecido e os enredo qui tá acontecendo no tempo de cada um. Ouví os aconselhamento dos passado qui tá em volta era o jeito de lutá pela sobrevivência e resistí.
Depois de caminhá pensativo té chegá na beirada das água, parô. Sabia qui as queixa do siô padre precisava sê estudada com cuidado. Não tinha solução de simplicidade, mais havia de sê tomada alguma providência. O rigô das lei pros preto e miserável é fácil, eles já sabe qui vai sê a primeira tarefa dos qui governa em nome do imperadô; depois, quase no mesmo tempo, é preciso arrasá com os antigovernista. Prendê e soltá, prendê e soltá, é um jeito de quebrá as resistência dos mais fraco; tem otros qui fica mais fácil comprá. E tem os caso qui só fazendo desaparecê na forca.
Os problema mais preocupante são os amigo indecente e descuidado. As fidalguia não podia recebê os rigô das lei mais acostumada tavam de tê as bondade das lei. Na Vila parecia qui a fidalguia toda era aparentada. Todo mundo tinha interesse de cuidá de uma, duas ou mais família: os fio, os pai, os irmão, as amante. O aconselhadô não podia chegá com as notícia nova e assustá o governadô
—        Os nossos amigos estão roubando as doações que fazem à obra Santa. Eles dão o donativo durante o dia, fazem o fingimento do bom amigo. E à noite voltam para levar parte do que foi dado.
—        O padre garante o que viu?
—        Ele garante que quem viu usava os olhos dele.
O governadô não parecia mais preocupado qui antes de sabê das acusação
—        Não podemos deixar esse justiçamento com as leis do divino? Afinal, não é coisa de muita gravidade.

—        É um jeito de não fazer o que tem que ser feito, mas o problema é o sinhô Padre e o sermão da domingueira. Do mesmo jeito que o povo escuta, o Imperador pode escutar. O sinhô Padre tem muitos olhos e ouvidos no Império. É muito arriscado fechar os olhos.
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